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Questões a serem observadas e priorizadas na regulamentação do FUNDEB permanente

A CNTE lançou recentemente a campanha “Regulamenta FUNDEB!”, com vistas a cobrar do Congresso Nacional a regulamentação imediata do novo art. 212-A da Constituição Federal, que instituiu em caráter permanente o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação.

O atual FUNDEB expira em 31.12.2020 e a partir de 1º de janeiro do próximo ano passa a valer o novo FUNDEB. Porém, a maior parte dos efeitos da Emenda Constitucional (EC) nº 108, que criou o FUNDEB permanente, necessita de regulamentação através de lei federal, a começar pelo critério de distribuição progressiva dos novos percentuais de complementação da União, que serão somados aos atuais 10%. Para 2021 está prevista a incorporação de 2% em forma de valor anual total mínimo por aluno (VAAT), que é a distribuição híbrida baseada na receita total dos recursos vinculados à educação. Ou seja: a complementação federal de 12% em 2021, de 15% em 2022, até chegar a 23% em 2026 precisa ser regulamentada sob o risco de não ser repassada em tempo hábil aos estados e municípios que mais precisam desses recursos. Dentro desse sistema híbrido de repasse federal, também há a vinculação obrigatória de 50% para a educação infantil que merecerá todo o cuidado do legislador para evitar drenagem de recursos para a educação privada e para adequar os arranjos distributivos às metas do Plano Nacional de Educação – PNE.

Dois projetos de lei já foram protocolados no Congresso Nacional com o objetivo de regulamentar o novo FUNDEB. O PL 4.372/2020, na Câmara dos Deputados, de autoria da deputada Professora Dorinha Seabra Rezende (DEM-TO), e o PL 4.519/2020, no Senado Federal, cujo autor é o senador Randolfe Rodrigues (RedeAP). O projeto do Senado se pauta no texto da Câmara, com algumas modificações, e a CNTE tem concordância com a maioria dos dispositivos contidos em ambas as proposições que se mostram fiéis aos comandos da EC 108, mas que precisam ser aperfeiçoadas ao longo da tramitação no Congresso Nacional.

O mais importante, neste momento, é avançar no debate da regulamentação e a CNTE entende ser imprescindível o trabalho conjunto entre Câmara e Senado, tal como ocorreu durante a tramitação da PEC 15/15, que contou com contribuições da PEC 65/19 do Senado. Para tanto, faz-se necessário oficializar as relatorias de ambas as propostas de regulamentação nas duas Casas parlamentares e abrir prazos para emendas e outros procedimentos regimentais. Dado o tempo ainda satisfatório para a aprovação dos projetos de lei, nada justifica uma eventual edição de Medida Provisória por parte do Executivo Federal para regular a matéria. Essa atitude seria desrespeitosa com o Congresso Nacional e com a sociedade, que também precisa participar da construção do novo FUNDEB.

Questão tormentosa e que tem dominado o debate político em torno da regulamentação do FUNDEB, diz respeito às tentativas de utilização dessa política educacional para financiar ações alheias à manutenção e desenvolvimento do ensino, a exemplo de programas de renda mínima. Essa tentativa de burlar o teto de gasto constitucional – com o qual a CNTE não concorda e por isso reivindica a revogação imediata da EC 95 –, não pode encontrar guarida na lei de regulamentação do FUNDEB, pois abriria perigoso precedente para outras
medidas de descaracterização dos investimentos na educação.

Outro tema relevante e que merece toda a atenção do parlamento e da sociedade refere-se às ameaças de desvinculação dos recursos constitucionais destinados à educação (e à saúde). A vinculação constitucional tem um histórico importante na trajetória republicana da educação brasileira, sendo que nos períodos em que deixou de vigorar ou quando esse direito foi parcialmente mitigado, os sistemas de ensino sofreram profundos reveses que levaram décadas para serem revertidos. O FUNDEB é a maior prova da importância da vinculação constitucional de recursos para a educação, embora sozinho seja insuficiente para arcar com a oferta escolar nos diferentes sistemas de ensino públicos. Com ele se ampliou o acesso, garantiu-se a permanência e elevou-se a qualidade da educação. Muito ainda precisa ser feito, mas o FUNDEB e a expansão do financiamento para a
educação pública são os caminhos que precisam ser trilhados para que o país garanta o direito à educação para todos e todas, com qualidade e equidade.

Os resultados do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica – IDEB, de 2019, não obstante as limitações inerentes a esse tipo de avaliação, apontam um crescimento significativo no padrão de qualidade da educação pública brasileira, fruto dos investimentos nas últimas décadas. Além de alocar mais e melhor os recursos na educação pública – e todos sabemos as carências que ainda predominam na maioria das escolas! –, o FUNDEB articulou outras políticas sensíveis à qualidade educacional, como o piso salarial do magistério, o avanço na formação inicial e continuada dos profissionais da educação e o fortalecimento de programas complementares, muitos deles desenvolvidos com recursos que integram o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação – FNDE, os quais não fazem parte do FUNDEB e por isso reforçam as políticas educacionais.

Com o novo FUNDEB é preciso avançar mais! O Custo Aluno Qualidade é medida essencial para assegurar os insumos necessários a todas as escolas públicas, de acordo com a etapa e a modalidade de ensino. E o novo preceito constitucional que dispõe sobre a ação redistributiva da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios em relação a suas escolas (art. 211, § 6º da CF), diferente da ideia de promover políticas de vouchers ou de gestão autônoma das escolas, precisa pautar o CAQ como referência para equalizar o atendimento escolar com base nos indicadores de insumos escolares e nas metas dos planos decenais de educação (nacional, estaduais e municipais). Dessa maneira, as políticas sistêmicas (FUNDEB, CAQ, ação redistributiva às escolas etc) ganham potencialidade para avançar na oferta pública escolar com qualidade.

Tanto a ação redistributiva às escolas como os demais critérios distributivos do FUNDEB devem ser regulamentados à luz dos compromissos do PNE e do art. 75 da Lei de Diretrizes e Bases da Educação – LDB.

A prioridade consiste em construir fórmulas de domínio público que especifiquem as ações e os investimentos compatíveis em âmbito da autonomia escolar para alcançar o padrão de qualidade do CAQ e que expressem com clareza os requisitos da EC 108 em relação ao nível socioeconômico dos educandos, à disponibilidade de recursos vinculados à educação em cada ente federado, ao potencial de arrecadação tributária dos entes públicos, à demanda potencial de matrículas derivada da busca ativa por novos estudantes, além dos critérios para a avaliação escolar em âmbito do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica (SINAEB). A duração da jornada, os tipos de estabelecimentos de ensino e outros requisitos de insumos precisam orientar as ponderações de investimentos do FUNDEB e a formulação do CAQ, tendo como referência os comandos e objetivos da
Constituição Federal (CF) e da legislação educacional que pautam o padrão de qualidade da educação pública.

A prioridade do investimento do FUNDEB na educação pública é condição essencial para a melhoria da escola que atende aproximadamente 81% das matrículas no nível básico de ensino. A escola pública é a grande escola do Brasil e precisa ser valorizada. Por óbvio que as instituições comunitárias, filantrópicas e confessionais conveniadas com os órgãos públicos (art. 213 da CF) desempenham importante função suplementar no atendimento escolar, especialmente onde o Estado não se encontra completamente presente. Mas a função auxiliar dessas entidades não pode sobrepor o compromisso público em atender adequadamente as matrículas escolares.

E não há que se cogitar na estrutura do FUNDEB repasses de recursos públicos para escolas privadas (com fins lucrativos ou mesmo para aquelas sem fins lucrativos que atuam em áreas com plena cobertura escolar estatal), pois isso desvirtuaria o caráter do fundo público e seus objetivos de qualificar a educação pública e de valorizar seus profissionais.

O novo FUNDEB e outros dispositivos da EC 108 preveem a implementação de políticas assessórias extremamente importantes para o funcionamento do fundo público. A reestruturação das informações e dados contábeis, orçamentários e fiscais das três esferas de governo é fundamental para garantir a rastreabilidade e para fazer a comparabilidade e a publicidade dos dados educacionais coletados, os quais deverão ser divulgados em meio eletrônico de amplo acesso (art. 163-A da CF). E o § 9º do art. 212 da Constituição determina que a lei deverá dispor sobre as normas de fiscalização, avaliação e controle das despesas com educação nas esferas estadual, distrital e municipal. Já o parágrafo único do art. 193 da Constituição passou a assegurar a participação da sociedade nos processos de formulação, monitoramento, controle e avaliação das políticas sociais, inclusive da educação.

Por outro lado, o Sistema Nacional de Educação – SNE, previsto no art. 214 da CF e no art. 13 da Lei 13.005 (PNE), ainda pendente de regulamentação, ganha mais centralidade e urgência com o FUNDEB permanente e seus diferentes critérios de distribuição de recursos aos entes federados. Isso porque a ação equalizadora do FUNDEB precisará caminhar em consonância com outras políticas de cooperação e colaboração entre os sistemas de ensino, tendo o CAQ como referência para o investimento público na educação (art. 211, §7º da CF). Outra pendência regulatória recai sobre o Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica, o qual, embora esteja previsto na alínea ‘c” do inciso V do art. 212-A (que trata da complementação da União por critérios meritocráticos), precisa se pautar nas orientações diagnósticas do PNE (art. 11 da Lei 13.005). A retirada dos aposentados e pensionistas das receitas do FUNDEB e demais rubricas destinadas à manutenção e desenvolvimento do ensino é também medida a ser procedida imediatamente pelos entes subnacionais que ainda operam essa irregularidade. Portanto, o sucesso do FUNDEB depende da regulamentação desses e outros mecanismos inerentes ao atendimento escolar, ao financiamento da educação, ao controle dos recursos e à participação social, devendo todos eles contarem com prazos para suas regulamentações na própria lei de operacionalização do FUNDEB.

Além do desafio imediato em regulamentar os critérios de repasse da nova complementação da União a partir de 2021 (2% do total de 13% adicionais que contabilizarão 23% em 2026), os projetos de lei em tramitação no Congresso preveem de forma acertada a atualização da Lei de regulamentação do FUNDEB, até 2022, quando deverão ser definidos (i) os custos e ponderações do valor anual por aluno entre etapas, modalidades, duração da jornada, tipos de estabelecimento de ensino e outros insumos (VAAF); (ii) as condicionalidades de melhoria da gestão escolar e os indicadores de atendimento e melhoria da aprendizagem com redução das desigualdades para fins de distribuição da complementação VAAR (repasse meritocrático de 2,5% da complementação da União); (iii) as diferenças e ponderações quanto ao valor anual por aluno relativas ao nível socioeconômico dos educandos e aos indicadores de disponibilidade de recursos vinculados à educação e de potencial de arrecadação tributária de cada ente federado, que definirão o repasse do valor anual total por aluno (VAAT). Espera-se, nessa mesma ocasião, proceder à regulamentação do CAQ, em âmbito da Lei Complementar que disporá sobre o SNE, bem como do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica.

Enquanto esses novos critérios e ponderações para o financiamento da educação básica não são definidos, ficarão valendo até 31.12.2022 as atuais ponderações do FUNDEB fixadas na lei de regulamentação.

E sobre esse ponto, a CNTE entende que alguns ajustes poderiam ser feitos nas ponderações, desde que isso não comprometa a tramitação da regulamentação (trata-se de questão que exige amplo acordo entre as esferas estaduais e municipais). Para a distribuição e a complementação federal relativas ao critério VAAT (custo aluno ano total), o critério de transição até 2022 será o mesmo definido pelo Estudo Técnico 22/2020, elaborado pela Consultoria de Orçamento e Fiscalização Financeira da Câmara dos Deputados, o qual balizou o debate da PEC 15/15. Esse critério leva em consideração a disponibilidade de recursos vinculados à educação em cada ente federado (25% e outras receitas), não adentrando nos demais indicadores qualitativos que serão definidos a posteriori (nível socioeconômico dos educandos e potencial de receita tributária dos entes). E a CNTE tem acordo quanto a esse encaminhamento. Já o critério VAAR (meritocrático) terá validade somente a partir de 2023, não merecendo adaptações na regulamentação federal. Contudo, no prazo de dois anos (até dezembro de 2022), os estados deverão aprovar leis próprias para definir o repasse meritocrático aos seus municípios de, no mínimo, 10% do percentual de 35% da cota-parte do ICMS municipal, com base em indicadores de melhoria nos resultados de aprendizagem e de aumento da equidade, considerando o nível socioeconômico dos educandos (art. 158, § único, inciso II da CF). E caberá aos sindicatos filiados à CNTE acompanharem esse debate nos parlamentos estaduais.

Feitas as considerações iniciais, e para fins de agilização do debate em torno da regulamentação do FUNDEB permanente, destacamos a seguir as principais observações da CNTE acerca dos projetos de lei 4.372/20 e 4.519/20, considerando a prevalência do primeiro no processo legislativo, porém reconhecendo diversos ajustes coerentes e necessários na versão do Senado que poderão ser absorvidos pela relatoria da Câmara dos Deputados. Reiteramos a importância de se preservar o protagonismo do Congresso na regulamentação do FUNDEB, devendo o Executivo não emitir Medida Provisória.

1. Sobre a composição dos recursos do FUNDEB e da Educação: garantir tanto na Constituição Federal como nas normas infraconstitucionais a manutenção da vinculação constitucional mínima de 25% da receita resultante de impostos dos Estados, DF e Municípios para a educação, bem como as subvinculações para o FUNDEB e para a valorização dos profissionais da educação. O país não pode regredir nesse direito! Quanto ao financiamento da educação superior, por parte dos Estados e eventualmente pelos Municípios, as receitas devem sempre comportar percentual superior a, pelo menos, 25% do mínimo estabelecido nacionalmente para a educação básica (área de ação prioritária dos entes subnacionais, conforme preceitua os §§ 2º e 3º do art. 211 e o § 3º do art. 212 da CF).

2. Sobre a distribuição dos recursos: priorizar o investimento em escolas públicas, com algumas exceções em áreas com defasagem no atendimento público que ficariam a cargo de instituições comunitárias, filantrópicas e confessionais conveniadas com o poder público (os projetos de lei tratam o tema de formas distintas). Para fins de conceituação na Lei, a educação básica comporta as etapas da educação infantil (creche e pré-escola), o ensino fundamental, o ensino médio e as modalidades de educação especial, educação profissional e tecnológica, educação de jovens e adultos, educação do campo, indígena e quilombola. A oferta escolar pública necessariamente deve assegurar os princípios da gratuidade, da laicidade, do pluralismo político, pedagógico e social, além do acesso universal sem quaisquer seletividades. E esses conceitos precisam definir as escolas para as quais os recursos do FUNDEB serão repassados, servindo de parâmetro inclusive para as instituições do art. 213 da CF.

3. Sobre o cômputo de matrículas para operacionalização do FUNDEB: os projetos de lei consideram somente as matrículas do ano anterior cadastradas no censo escolar. Esse método inibe a inclusão de novos estudantes nas redes de ensino, sobretudo na EJA e nas creches, pois os entes públicos precisam arcar sozinhos com os custos dessas matrículas durante o período em que elas não estão computadas no censo escolar. O ideal seria criar excepcionalidades para a inclusão de novas matrículas durante o ano em curso, a fim de forçar a busca ativa de novos estudantes. O Brasil atende menos de 40% das crianças em creches e cerca de 77 milhões de jovens e adultos ainda não concluíram a educação básica.
É preciso avançar na escolarização dessas pessoas e na alfabetização de outros 11 milhões de brasileiros. E compete ao FUNDEB fomentar esse avanço na educação.

4. Sobre o Custo Aluno Qualidade: é importante a lei de regulamentação do FUNDEB prever a futura recepção desse dispositivo, que carece de regulamentação própria na Lei do Sistema Nacional de Educação. O ideal é regulamentar o CAQ em conjunto – senão antes – dos demais critérios de distribuição do FUNDEB (VAAF, VAAT e VAAR).

5. Sobre os profissionais da educação: a lei de regulamentação precisa recepcionar de forma expressa a Lei 11.738 (piso salarial do magistério), a fim de evitar quaisquer interpretações imprecisas sobre sua validade a partir de 1º.01.2021. Deve, também, prever a regulamentação futura do piso salarial profissional nacional previsto no art. 206, VIII da CF. Os estudos do CAQ e dos fatores de distribuição do FUNDEB ajudarão a avançar nos critérios de definição desse novo piso salarial destinado ao conjunto dos profissionais da educação básica pública. O art. 44 do PL 4.372 e o art. 45 do PL 4.519 precisam se reportar aos demais indicadores da meta 18 do PNE para orientar a composição dos planos
de carreira dos profissionais da educação. Por sua vez, o projeto do Senado é mais coerente ao excluir os profissionais da educação cedidos às instituições conveniadas da rubrica de 70% para pagamento de pessoal. Ocorre que tais transferências não entram no cômputo da Lei de Responsabilidade Fiscal (LC 101/00) e por isso não devem ser contabilizadas como despesas com pessoal. Os 70% devem se destinar somente aos profissionais em efetivo exercício nas redes públicas de ensino. Outra questão que merece cuidado é a inclusão de trabalhadores não profissionalizados (parcela significativa dos funcionários da educação) na subvinculação de 70%. O texto do EC 108 e dos projetos de lei destinam
essa rubrica para pagamento dos “profissionais da educação”, o que excetua os trabalhadores não detentores de formação pedagógica, segundo as normas do Conselho Nacional de Educação.

6. Prazos para outras regulamentações: em razão da importância dos demais temas inerentes à operacionalização do FUNDEB, além dos critérios de distribuição ponderada dos recursos, seria importante que a lei de regulamentação definisse prazos regulatórios para todas as pendências (CAQ, SNE, SINAEB, normas de informação, divulgação, controle e avaliação dos recursos educacionais, piso salarial para todos os profissionais da educação etc).

7. Manutenção da vinculação dos recursos do FUNDEB sobre precatórios: a atual disputa judicial em torno da vinculação dos precatórios do antigo FUNDEF para a educação e seus profissionais requer prevenção na regulamentação do novo FUNDEB, de modo que a lei possa resguardar a aplicação original dos recursos do Fundo relativos a eventuais precatórios futuros pagos aos entes subnacionais. A proposta consiste em incluir artigo mantendo inalterada a afetação constitucional do FUNDEB, mesmo que o ingresso de recursos em forma de precatórios ocorra em períodos diversos. Essa orientação tem previsão legal no parágrafo único do art. 8º da LC 101/00 – LRF.

8. Gestão democrática e ampliação da fiscalização dos recursos da educação: à luz do parágrafo único do art. 193 da CF, a Comissão Intergovernamental de Financiamento para a Educação Básica de Qualidade necessita contar com a participação de atores sociais, entre os quais, os/as trabalhadores/as em educação e os/as estudantes. E em relação as atribuições dos Conselhos de Acompanhamento e Controle Social, não faz sentido manter a apuração dos dados relativos somente à cesta do FUNDEB, uma vez que o total dos recursos vinculados de cada ente federado será utilizado para formar o critério VAAT de repasse financeiro. Daí a necessidade de ampliar a fiscalização para todos os recursos
vinculados (mínimo de 25% e outros).

9. Sobre os critérios para a ação redistributiva de recursos às escolas: a lei de regulamentação precisa definir as áreas de abrangência para utilização desses recursos, preservando a gestão das redes de ensino. Compete às escolas adquirir e gerir insumos que garantam o padrão de qualidade escolar, sobretudo por meio do financiamento de programas e ações complementares voltados aos parâmetros do CAQ. Questões relativas a contratos e remuneração de pessoal, prestação de serviços educacionais (consultorias, cursos etc), entre outros, não são de responsabilidade das escolas, pois estão sujeitos a planejamentos das redes e do quadro funcional à luz do plano de carreira da categoria.

10. Sobre as ponderações válidas para 2021 e 2022: a manutenção das atuais ponderações do FUNDEB para os próximos dois anos tende a comprometer a oferta escolar nas etapas e modalidades que já apresentam graves estrangulamentos orçamentários, sobretudo a creche integral e demais etapas escolares com oferta de ensino em tempo integral. O ideal seria rever algumas ponderações para ajustar o atendimento público nos entes mais sobrecarregados com a oferta escolar, bem como prover melhores condições de acesso e permanência em determinadas modalidades com baixa oferta pública e/ou com mais deficiências no atendimento (EJA, educação especial, do campo, indígena, quilombola). Contudo, esse ajuste que requer ampla negociação interfederativa não pode interferir no prazo de aprovação da lei de regulamentação.

11. Sobre a capacidade de atendimento das matrículas pelos entes federados: o FUNDEF ficou marcado pela grande (e inconsequente) transferência de matrículas das redes estaduais para os entes municipais, notadamente com menos estrutura e capacidade tributária para comportar acréscimos no atendimento escolar. Além de prever todas as medidas cabíveis para eventuais processos de transferência de matrículas entre redes, é imperioso que o Congresso debata com base em informações tributárias, fiscais, de IDH e outras, os critérios para possíveis transferências de matrículas entre redes estaduais e municipais. Entes públicos com baixa capacidade de atendimento escolar não podem ser
sobrecarregados com mais encargos. A qualidade da educação está intrinsicamente ligada aos recursos de infraestrutura, aos quadros funcionais qualificados e à capacidade de financiamento e gestão das escolas. Os recursos do FUNDEB representam em média 60% dos custos escolares. Os entes precisam arcar com o restante através de tributos e transferências que integram suas receitas próprias. Não considerar esses fatores é algo bastante prejudicial para a educação.

Brasília, 20 de outubro de 2020
Diretoria da CNTE

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